O direito de preferência dos arrendatários

O arrendamento pode ser habitacional ou comercial. Apesar de poder existir direito de preferência nas duas modalidades, como elas são ligeiramente diferentes, hoje vamos nos debruçar mais sobre o arrendamento habitacional.

O mercado imobiliário tem estado em alta, atingindo preços muitas vezes considerados exagerados e desproporcionais face à realidade económica das pessoas. A lei da oferta e da procura está a atingir proporções descontroladas.

E, com isto, temos vindo cada vez mais a assistir a situações em que o proprietário informa o arrendatário de que pretende vender o seu imóvel. Face a esta situação, vamos analisar quais são os trâmites a cumprir, prazos e consequências.

Quando existe o direito de preferência?

Se estás no imóvel há mais de 2 anos, então tens direito de preferência. O senhorio/proprietário é obrigado a enviar-te uma carta registada com aviso de receção a comunicar que pretende vender o imóvel, descrevendo os termos do negócio (o designado projeto de venda). Entre outros elementos que sejam considerados relevantes para a celebração do negócio, tem de constar o valor de venda, a previsível data para a realização da escritura, os dados do comprador e o método de pagamento. Esta comunicação tem de ser remetida para a morada que se encontra convencionada no contrato de arrendamento e, na falta dela, para a morada do imóvel. O arrendatário tem 30 dias para comunicar a sua resposta.

Até aqui parece simples certo?

Mas a nossa legislação tem sempre de complicar um bocadinho.

Assim, não basta estares no imóvel há mais de 2 anos. O teu direito só se aplica nos casos de venda do imóvel ou da dação em cumprimento. Em sentido contrário, não se aplica no casos em que o proprietário celebra uma permuta.

Se não estas familiarizado com a figura da dação em cumprimento, posso esclarecer-te de forma muito rápida e rudimentar que é o que acontece na seguinte situação: o proprietário tem uma dívida a um credor no valor de 150.000€ e não tem dinheiro para pagar, mas tem um imóvel no valor de 150.000€ que é onde tu estar a residir como arrendatário. Neste caso o proprietário dá o imóvel para cumprimento da dívida.

Ora, nestas 2 situações, o arrendatário pode igualar a oferta e tem preferência. Na permuta é simples perceber porque não se aplica, pois teria de ter um imóvel que correspondesse exatamente ao que o outro comprador estaria disposto a aceitar em troca.

Aplica-se a todos os imóveis arrendados?

Nos imóveis em que existe propriedade horizontal constituída, o arrendatário tem direito sobre a fração arrendada.

Nos imóveis em que não existe propriedade horizontal legalmente constituída, os designados prédios multifração (não têm frações autónomas constituídas mas estão divididos em frações suscetíveis de utilização independente) o direito de preferência tem de ser exercido por todos os arrendatários em simultâneo sendo o valor dividido por cada um em função da permilagem.

Ora, o artigo 1091º /8 do Código Civil estabelece uma coisa bem diferente, estipulando que “No caso de contrato de arrendamento para fins habitacionais relativo a parte de prédio não constituído em propriedade horizontal, o arrendatário tem direito de preferência nos mesmos termos previstos para o arrendatário de fração autónoma, a exercer nas seguintes condições:

  1. O direito é relativo à quota-parte do prédio correspondente à permilagem do locado pelo valor proporcional dessa quota-parte face ao valor total da transmissão;”

Isto significaria que o arrendatário do rés do chão poderia exercer, sozinho, o seu direito de preferência. Contudo, o Tribunal Constitucional veio declarar esta norma inconstitucional no seu Acórdão 299/2020. Apesar do artigo não ter sido revogado e continuar presente no Código Civil, o mesmo não pode produzir efeitos. Assim, tal como referi anteriormente, nos prédios multifração, o direito de preferência tem de ser exercido por todos os arrendatários em simultâneo.

E quanto aos prédios rústicos?

O direito de preferência do arrendatário aplica-se a arrendamentos agrícolas ou florestais que durem há mais de 3 anos. A forma de comunicação por parte do proprietário/ senhorio é exatamente igual ao estipulado para o arrendamento habitacional, mas o prazo de resposta do arrendatário é de apenas 8 dias.

Nesta modalidade, temos ainda outra particularidade a ter em atenção.

No caso do arrendatário exercer o direito de preferência tem obrigatoriamente de explorar o terreno durante 5 anos após a aquisição sob pena de ter de indemnizar o senhorio em 5 rendas e ter de ceder a propriedade ao outro comprador interessado.

E se, em qualquer situação, o proprietário não comunicar a intenção de venda ao arrendatário?

É possível a venda mas tens de ter consciência que o arrendatário poderá intentar uma ação de direito de preferência no prazo de 6 meses a contar da notificação.

Se és senhorio e no caso de não cumprires a formalidade de enviar uma carta registada com aviso de receção, aconselho-te a informar o arrendatário por outro meio (seja mensagem escrita, email…) para que comece a correr o prazo dos 6 meses para uma eventual ação de direito de preferência.

Mas atenção, este não é o caminho.

O correto a fazeres é cumprires com todos estes requisitos.

Fonte: https://diariodarepublica.pt/dr/legislacao-consolidada/decreto-lei/1966-34509075-116818986

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